As canseiras desta vida
tanta mãe envelhecida
a escovar
a escovar
a jaqueta carcomida
fica um farrapo a brilhar
Cozinheira que se esmera
faz a sopa de miséria
a contar
a contar
os tostões da minha féria
e a panela a protestar
Dás as voltas ao suor
fim do mês é dia 30
e a sexta é depois da quinta
sempre de mal a pior
E cada um se lamenta
que isto assim não pode ser
que esta vida não se aguenta
-o que é que se há-de fazer?
Corta a carne, corta o peixe
não há pão que o preço deixe
a poupar
a poupar
a notinha que se queixa
tão difícil de ganhar
Anda a mãe do passarinho
a acartar o pão pró ninho
a cansar
a cansar
com a lama do caminho
só se sabe lamentar
É mentira, é verdade
vai o tempo, vem a idade
a esticar
a esticar
a ilusão de liberdade
pra morrer sem acordar
É na morte ou é na vida
que está a chave escondida
do portão
do portão
deste beco sem saída
-qual será a solução?
Um tractor
quando é usado com amor
com o amor da terra nas rodas
quando é usado para todas
as bocas que dele dependem
quando os que o usam se entendem
para dividir o produto
segundo as necessidades
unindo a máquina ao fruto
unindo o campo às cidades.
Um tractor
dá que fazer ao suor
dos que põem na sementeira
as sementeiras da maneira
como as coisas se farão
e o nome revolução
pode bem ser atribuido
a um tractor assim usado
a um braço assim estendido
entre o futuro e o passado.
Um tractor
trabalha a todo o vapor
quando a gente que o trabalha
não tem nada que lhe valha
a não ser a sua vida
mal amada e mal sofrida
a não ser a sua história
embora de má memória
a não ser a alternativa
que é a vida na cooperativa.
Vi-te a trabalhar o dia inteiro
Construir as cidades para os outros
Carregar pedras, desperdiçar
Muita força pra pouco dinheiro
Vi-te a trabalhar o dia inteiro
Muita força pra pouco dinheiro
Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
Que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Que te põe de bem com os outros
e de mal contigo
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Não me digas que não me compreendes
Quando os dias se tornam azedos
Não me digas que nunca sentiste
Uma força a crescer-te nos dedos
E uma raiva a nascer-te nos dentes
Não me digas que não me compreendes
Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
Que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Que te põe de bem com os outros
e de mal contigo
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Vi-te a trabalhar o dia inteiro
Construir as cidades para os outros
Carregar pedras, desperdiçar
Muita força pra pouco dinheiro
Vi-te a trabalhar o dia inteiro
Muita força pra pouco dinheiro
Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
Que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Que te põe de bem com os outros
e de mal contigo
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
Quando o avião aqui chegou
Quando o mês de maio começou
Eu olhei para ti
Então entendi
Foi um sonho mau que já passou
Foi um mau bocado que acabou
Tinha esta viola numa mão
Uma flor vermelha na outra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a fronteira me abraçou
Foi esta bagagem que encontrou
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
Pra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E então olhei à minha volta
Vi tanta esperança andar à solta
Que não hesitei
E os hinos cantei
Foram feitos do meu coração
Feitos de alegria e de paixão
Quando a nossa festa se estragou
E o mês de Novembro se vingou
Eu olhei pra ti
E então entendi
Foi um sonho lindo que acabou
Houve aqui alguém que se enganou
Tinha esta viola numa mão
Coisas começadas noutra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a espingarda se virou
Foi pra esta força que apontou
E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta
Que me perguntei
Se os hinos que cantei
Eram só promessas e ilusões
Que nunca passaram de canções
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
Quando eu finalmente eu quis saber
Se ainda vale a pena tanto crer
Eu olhei para ti
Então eu entendi
É um lindo sonho para viver
Quando toda a gente assim quiser
Tenho esta viola numa mão
Tenho a minha vida noutra mão
Tenho um grande amor
Marcado pela dor
E sempre que Abril aqui passar
Dou-lhe este farnel para o ajudar
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou p´ra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E agora eu olho à minha volta
Vejo tanta raiva andar a solta
Que já não hesito
Os hinos que repito
São a parte que eu posso prever
Do que a minha gente vai fazer
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei prá aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
Aldeia da Meia-Praia, ali mesmo ao pé de Lagos
Vou fazer-te uma cantiga da melhor que sei e faço
De Monte Gordo vieram, alguns por seu próprio pé
Um chegou de bicicleta outro foi de marcha a ré
Quando os teus olhos tropeçam no voo de uma gaivota
Em vez de peixe vê peças de oiro caindo na lota
Quem aqui vier morar, não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra se constrói uma cabana
Tu trabalhas todo o ano, na lota deixam-te mudo
Chupam-te até ao tutano, levam-te o couro cabeludo
Quem dera que a gente tenha de Agostinho a valentia
Para alimentar a senha de esganar a burguesia
Adeus disse a Monte Gordo, nada o prende ao mal passado
Mas nada o prende ao presente se só ele é o enganado
Oito mil horas contadas laboraram a preceito
Até que veio o primeiro documento autenticado
Eram mulheres e crianças, cada um com seu tijolo
Isto aqui era uma orquestra, quem diz o contrário é tolo
E se a má língua não cessa, eu daqui vivo não saia
Pois nada apaga a nobreza dos índios da Meia-Praia
Foi sempre a tua figura tubarão de mil aparas
Deixas tudo à dependura quando na presa reparas
Das eleições acabadas do resultado previsto
Saiu o que tendes visto muitas obras embargadas
Mas não por vontade própria porque a luta continua
Pois é dele a sua história e o povo saiu à rua
Mandadores de alta finança fazem tudo andar pra traz
Dizem que o mundo só anda tendo á frente um capataz
Eram mulheres e crianças cada um com seu tijolo
Isto aqui era uma orquestra, quem diz o contrário é tolo
E toca de papelada no vaivém dos ministérios
Mas hão de fugir aos berros inda a banda vai na estrada
Comentários
Enviar um comentário