Canto de Amigos

Este parte, aquele parte
e todos, todos se vão.
Galiza ficas sem homens
que possam cortar teu pão.

Tens em troca órfãos e órfãs
Tens campos de solidão.
Tens mães que não têm filhos
Filhos que não têm pai.

Coração que tens e sofre
Longas ausências mortais.
Viúvas de vivos mortos
Que ninguém consolará.

Este parte, aquele parte
E todos, todos se vão.
Galiza ficas sem homens
Que possam cortar teu pão.

Dão-nos um lírio e um canivete
E uma alma para ir à escola
Mais um letreiro que promete
Raízes, hastes e corola

Dão-nos um mapa imaginário
Que tem a forma de uma cidade
Mais um relógio e um calendário
Onde não vem a nossa idade

Dão-nos a honra de manequim
Para dar corda à nossa ausência
Dão-nos um prémio de ser assim
Sem pecado e sem inocência

Dão-nos um barco e um chapéu
Para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céu
Levado à cena num teatro

Penteiam-nos os crâneos ermos
Com as cabeleiras dos avós
Para jamais nos parecermos
Connosco quando estamos sós

Dão-nos um bolo que é a história
Da nossa historia sem enredo
E não nos soa na memória
Outra palavra para o medo

Temos fantasmas tão educados
Que adormecemos no seu ombro
Sonos vazios despovoados
De personagens do assombro

Dão-nos a capa do evangelho
E um pacote de tabaco
Dão-nos um pente e um espelho
Pra pentearmos um macaco

Dão-nos um cravo preso à cabeça
E uma cabeça presa à cintura
Para que o corpo não pareça
A forma da alma que o procura

Dão-nos um esquife feito de ferro
Com embutidos de diamante
Para organizar já o enterro
Do nosso corpo mais adiante

Dão-nos um nome e um jornal
Um avião e um violino
Mas não nos dão o animal
Que espeta os cornos no destino

Dão-nos marujos de papelão
Com carimbo no passaporte
Por isso a nossa dimensão
Não é a vida, nem é a morte

Vi-te a trabalhar o dia inteiro
construir as cidades pr´ós outros
carregar pedras, desperdiçar
muita força p´ra pouco dinheiro
Vi-te a trabalhar o dia inteiro
Muita força p´ra pouco dinheiro

Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
que te põe de bem com outros
e de mal contigo
Que força é essa, amigo
Que força é essa, amigo
Que força é essa, amigo

Não me digas que não me compr´endes
quando os dias se tornam azedos
não me digas que nunca sentiste
uma força a crescer-te nos dedos
e uma raiva a nascer-te nos dentes
Não me digas que não me compr´endes

(Que força...)

(Vi-te a trabalhar...)

Que força é essa
que força é essa
que trazes nos braços
que só te serve para obedecer
que só te manda obedecer
Que força é essa, amigo
que força é essa, amigo
que te põe de bem com outros
e de mal contigo
Que força é essa, amigo
Que força é essa, amigo
Que força é essa, amigo
Que força é essa, amigo

Venham mais cinco
Duma assentada que eu pago já
Do branco ao tinto
Se o velho estica, eu fico por cá
Se tem má pinta
Dá-lhe um apito e põe-no a andar
De espada na cinta
Já crê que é rei de quem é de além-mar

Não me obriguem a vir para a rua gritar
Que é já tempo de embalar a trouxa e zarpar

A gente ajuda
Havemos de ser mais, eu bem sei
Mas há quem queira
Deitar abaixo o que eu levantei
A bucha é dura
Mais dura é a razão que a sustem
Só nesta rusga
Não há lugar pros filhos da mãe

Não me obriguem a vir para a rua gritar
Que já é tempo de embalar a trouxa e zarpar

Bem me diziam
Bem me avisavam como era a lei
Na minha terra
Quem trepa no coqueiro é o rei
A bucha é dura
Mais dura é a razão que a sustem
Só nesta rusga
Não há lugar pros filhos da mãe

Não me obriguem a vir para a rua gritar
Que é já tempo de embalar a trouxa e zarpar

Comentários