Sérgio Godinho & Assessores no Coliseu

Dois três zero
O guarda chamas já não tarda
Hão-de revirar a cama
Hão-de revistar a cela
Olhar, espiolhar, esquadrinhar
Verificar barra a barra
Se a janela

Na prisão
Na prisão
Poucos são os teus pertences
Mas ninguém sabe onde escondes
O que de secreto penses

Na prisão
Na prisão
O portão abre ao contrário
E é na culpa que defrontas
O maior adversário

Na prisão
Na prisão
A lição serve pra vida
Nunca pouses onde sempre
Podes andar de fugida

Na prisão
Na prisão
Muitos são os preventivos
Só na sentença contarás ao certo os dias já perdidos

Hoje é dia de visita
Rapariga
Pinta a boca e ata a fita
Hoje é dia de visita
Meu rapaz
Põe a camisa bonita

Sou pra ti, aqui me tens
Pra semana, vens, não vens
Vai tocar a campaínha
E a tua mão ainda na minha
E em surdina já te gritas
Porque há horas tão velozes
E semanas infinitas

Na prisão
Na prisão
Um irmão é precioso
Pouco interessa que a lei justa
Veja nele um criminoso

Na prisão
Na prisão
Dentro do pão dois pacotes
Pode ser que ao consumi-los
Muitas raivas tu enxotes

Na prisão
Na prisão
O pulmão respira à toa
Não se entende se morrer
É quase nunca coisa boa

E na prisão
E na prisão
O tesão é cofre-forte
Que ora solta a semente
Para a vida ou para a morte

Hoje é dia de visita
Rapariga
Pinta a boca e ata a fita
Hoje é dia de visita
Meu rapaz
Põe a camisa bonita

Sou pra ti, aqui me tens
Pra semana, vens, não vens
Vai tocar a campaínha
E a tua mão ainda na minha
E em surdina já te gritas
Porque há horas tão velozes
E semanas infinitas

Na prisão
Na prisão
O trovão não relampeja
Mas ao menos nessa espera
Nunca abrigo se deseja

Na prisão
Na prisão
A televisão nunca tem grades
Passa crimes e delitos
Que vão ser impunidades

Na prisão
Na prisão
Com razão se tenta a fuga
Mas quando avanças marcas passo
Impaciente tartaruga

Na prisão
Na prisão
A escuridão nunca nos cega
Vemos túneis que se acendem
Quando neles se escorrega

Hoje é dia de visita
Rapariga
Pinta a boca e ata a fita
Hoje é dia de visita
Meu rapaz
Põe a camisa bonita

Sou pra ti, aqui me tens
Pra semana, vens, não vens
Vai tocar a campaínha
E a tua mão ainda na minha
E em surdina já te gritas
Porque há horas tão velozes
E semanas infinitas

Na prisão
Na prisão
O portão abre pra fora
E a liberdade é de repente
O que ao longe te apavora

E da prisão
Da prisão
Tens na mão a tatuagem
Que perfura os caminhos
Em quadrado da viagem

Etelvina com seis meses já se tinha de pé
Foi deixada num cinema depois da matinée
Com um recado na lapela que dizia assim
''Quem tomar conta de mim
Quem tomar conta de mim
Saiba que fui vacinada
Saiba que sou malcriada''

Etelvina com dezasseis anos já conhecia
Todos os reformatórios da terra onde vivia
Entregaram-na a uma velha que ralhava assim
''Ai menina sem juízo
Nem mereces um sorriso
Vais acabar num bueiro
Sem futuro nem dinheiro''

"Eu durmo sozinha à noite
Vou dormir à beira rio à noite, à noite
Acocorada com o frio à noite, à noite"

Etelvina era da rua como outros são do campo
Sua cama era um caixote sem paredes nem tampo
Sua janela uma ponte que dizia assim
''Dentro das minhas cidades
Já não sei quem é ladrão
Se um que anda fora de grades
Se outro que está na prisão ''

Etelvina só gostava era de andar pela cidade
A semear desacatos e a colher tempestades
A meter-se cos ricaços, a dizer assim:
''Você que passa de carro
Ferre aqui a ver se eu deixo
Venha cá que eu já o agarro
Dou-lhe um pontapé no queixo''

"Eu durmo sozinha à noite
Vou dormir à beira rio à noite, à noite
Acocorada com o frio à noite, à noite"

Etelvina já cansada de viver sem ninguém
A não ser de vez em quando amores de vai e vem
Pôs um anúncio no jornal que dizia assim:
''Mulher desembaraçada
Quer viver com alma irmã
De quem não seja criada
De quem não seja mamã''

Etelvina já sabia que não ia encontrar
Nem um príncipe encantado, nem um lobo do mar
Só alguém com quem pudesse dizer assim:
''O amor já não é cego
Abre os olhinhos à gente
Faz lutar com mais apego
A quem quer vida diferente''

O seu homem encontro-o à noite
A dormir à beira rio, à noite, à noite
Acocorado com frio à noite, à noite

Espalhem a notícia
na Lisboa que amanhece
se O galo é o dono dos ovos
à mulher, o que acontece?

Cão raivoso, Aguenta aí!
a tua fala é uma Emboscada
Tem Embalo e Matraquilhos
E sabe A Noite Passada

Liberdade, Dias úteis
Horas extraordinárias
Etelvina, Rita, Alice
tantas lutas necessárias

Cuidado com as imitações
e as Bíblias desse deus ateu
Há bilhetes de ida e volta
Salazar nunca morreu

Toca e foge, Não respire!
Mais uma canção de medo
Antes o poço da morte
Do que cantar em segredo!

Liberdade, Dias úteis
Horas extraordinárias
Homens de sete instrumentos
tantas lutas necessárias

Pode alguém ser quem não é?
se for só Contrafacção?
quando o Lobo vai à missa…
sai de lá um Charlatão

Obrigada, caro amigo
pelo Elixir de amor
plas Canções que são abraços
ao partir, Parto sem dor

Até domingo que vem!
O sonho não será defunto!
Se a liberdade é a chamada
nunca Mudemos de assunto!

já vejo o céu em fogo
há quem diga que estou louco
nunca me senti tão só

e a dor que mais me mata
é já não te fazer falta
é fazer falta a ninguém

já nascemos de joelhos
já dobrados pelo meio
ensinados a querer

só aquilo que não temos
só as terras que não vemos
a corrida não tem fim

e a vida fica difícil
o tempo passa tipo míssil
derramado em suor

e o que achamos importante
perdemos mais adiante
no fim só restamos nós
a vida fica difícil

já vejo o céu em fogo
cuidado que estou louco
nunca me senti tão só

seguimos ofendidos
todos sérios e contidos
inundados em pudor

tenho medo destes muros
pensamentos crus e duros
sempre prontos a julgar

eu já nem sei rir direito
toda a graça é um parapeito
calma, foi em paz que vim

e a vida fica difícil
o tempo passa tipo míssil
derramado em suor

e o que achamos importante
perdemos mais adiante
no fim só restamos nós

de onde vem esta saudade
espalhar-se na cidade
em forma de souvenir

que venha quem vier por bem
mas não se trate com desdém
quem tratou deste lugar

Com um brilhozinho nos olhos
E a saia rodada
Escancaraste a porta do bar
Trazias o cabelo aos ombros
Passeando de cá para lá
Como as ondas do mar
Conheço tão bem esses olhos
E nunca me enganam
O que é que aconteceu diz lá
É que hoje fiz um amigo
E coisa mais preciosa no mundo não há
É que hoje fiz um amigo
E coisa mais preciosa no mundo não há

Com um brilhozinho nos olhos
Metemos o carro
Muito à frente muito à frente dos bois
Ou seja fizemos promessas
Trocámos retratos
Traçámos projectos a dois
Trocámos de roupa trocámos de corpo
Trocámos de beijos tão bom é tão bom
E com um brilhozinho nos olhos
Tocámos guitarras
Pelo menos a julgar pelo som
E com um brilhozinho nos olhos
Tocámos guitarras
Pelo menos a julgar pelo som

E o que é que foi que ele disse?
E o que é que foi que ele disse?
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Passa aí mais um bocadinho
Que estou quase a ficar louco
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Portanto
Hoje soube-me a pouco

Com um brilhozinho nos olhos
Corremos os estores
Pusemos a rádio no on
Acendemos a já costumeira
Velinha de igreja
Pusemos no off o telefone
E olha não dá para contar
Mas sei que tu sabes
Daquilo que sabes que eu sei
E com um brilhozinho nos olhos
Ficámos parados
Depois do que não te contei
E com um brilhozinho nos olhos
Ficámos parados
Depois do que não te contei

Com um brilhozinho nos olhos
Dissemos sei lá
Tudo o que nos passou pela tola/pelo goto
Do estilo: és o number one
Dou-te vinte valores
És um treze no totobola/totoloto
E às duas por três
Bebemos um copo
Fizemos o quatro e pintámos o sete
E com um brilhozinho nos olhos
Ficámos imóveis
A dar uma de tête a tête
E com um brilhozinho nos olhos
Ficámos imóveis
A dar uma de tête a tête

E o que é que foi que ele disse?
E o que é que foi que ele disse?
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Passa aí mais um bocadinho
Que estou quase a ficar louco
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Portanto
Hoje soube-me a pouco

E com um brilhozinho nos olhos
Tentámos saber
Para lá do que muito se amou
Quem éramos nós
Quem queríamos ser
E quais as esperanças
Que a vida roubou
E olhei-o de longe
E mirei-o de perto
Que quem não vê caras
Não vê corações
E com um brilhozinho nos olhos
Guardei um amigo
Que é coisa que vale milhões
E com um brilhozinho nos olhos
Guardei um amigo
Que é coisa que vale milhões

E o que é que foi que ele disse?
E o que é que foi que ele disse?
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco
Passa aí mais um bocadinho
Que estou quase a ficar louco
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Hoje soube-me a tanto
Portanto
Hoje soube-me a pouco

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