Sérgio Godinho na Sala 2 da Casa da Música

Não sei se estão a ver
aqueles dias em que
não acontece nada
a não ser o que
aconteceu
e não aconteceu

e do nada
há uma luz
que se acende
não se sabe
se vem de fora ou
se vem de dentro
apareceu

e dentro da porção
da tua vida, é a ti
que cabe o não trocar
nenhum futuro
pelo presente
o fazer face à face
que se teve até ali
ausente
presente

Vê lá o que fazes, há
tanto a fazer
fazes que fazes
ou pões sementes
a crescer?
Precisas de água
terra também
ventos cruzados
e o sol a chuva
que os detém
vivida a planta
refeita a casa
é espaço em branco
tempo de o escrever
e abrir asa
e a linha funda, na
palma da mão
desenha o tempo
então
desenha o tempo
então

Mas há limites de água
que cruzas
sem sequer notares
e oh, estás no deserto
e talvez no oásis
se o olhares
e não há mal
e não há bem
que não te venha
incomodar
vale esse valor?
é pra vender
ou comprar?
mas hoje
questões éticas?
agora?
por favor
que te iam prescrever
a tal receita
para a dor
vais ter que reciclar
o muito frio
e o muito quente
ausente
presente

Vê lá o que fazes, há
tanto a fazer
fazes que fazes
ou pões sementes
a crescer?
e a linha funda, na
palma da mão
desenha o tempo
então
desenha o tempo
então

"um curto espaço
de tempo"
vais preenchê-lo
com o frio
da morta morrida
ou o calor
da vida vivida?

não queiras ser
nem um exemplo
nem um mau exemplo
por si só
há dias em que é
grão da mesma mó

e a senha já tirada
já tardia
do doente
dez lugares atrás
e pouco a pouco
à frente
e cada um falar-te
das histórias
da sua vida
feliz
dorida

Vê lá o que fazes, há
tanto a fazer
fazes que fazes
ou pões sementes
a crescer?
Precisas de água
terra também
ventos cruzados
e o sol a chuva
que os detém
vivida a planta
refeita a casa
é espaço em branco
tempo de o escrever
e abrir asa
e a linha funda, na
palma da mão
desenha o tempo
então
desenha o tempo
então

e explicaram-te
em botânica,
uma espécie
que não muda
a flor do fatalismo
está feito
e se até
dá jeito alterar
só por hoje o amanhã
melhor é
transfigurar o amanhã
com todo o hoje

e as palavras tornam-se
esparsas
assumes
fazes que disfarças
escolhes paixões
ciúmes
tragédias e farsas
e faças o que faças
por vales e cumes
enconstras-te a sós, só
grão a grão
acompanhado e só
grão da mesma mó
grão da mesma mó
grão da mesma mó
grão da mesma mó

Comentários